vão-se os versos
nesse silêncio
que te interrompe as memórias de tudo
e te revolve poeiras da frieza aguda
até que se estilhacem promessas
coisas feitas no pensamento,
e no avesso descobres haver nada

o vazio do vento distante
das horas meras,
o assobio que assusta
o fosso imenso do medo
a crescer, a crescer, a crescer...
sem que um gesto aqueça
este afago longe de ser morno

enche-te esse susto
como verbo e terminações
e esmagas afectos, cumpres
com a defesa que o corpo te dá
à espera que se estale a máscara
e a chama te queime
o pudor que de ti alastra


Lisboa, 28 de Março de 2014
Lino Costa
in: versejos livres

assim
por quase nada
gela-me a alma
o sangue quente,
quando o fácil se faz
um acontecer, na partida
na desmesura do tempo
d'um dia inteiro
que cresce lento
qu' escorre como unguento
pela formosura da memória
deste incompleto agoiro,
espera abissal opaca,
a que não virás ao meu lugarejo
nem à volta aguçada do meio dia
hoje só te trará o sol poente


Lisboa, 14 de Março de 2014
Lino Costa
in: Versejos Livres